quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

Alma Antiga

Somos almas antigas.
Estradas que os olhos escreveram corpo adentro.
Episódios que digerimos para o mundo.
Depoimentos de quem não somos.

Não conhecemos a exaustão, apesar da curva dos verbos.
Os lugares que deixamos esmaecem com calma.
Temos o alívio de não sermos donos de nada.
A idade das retinas viu passar
o tempo das coisas que envelhecem.

Cada dia nos ensinou
a remover das coisas a pele dos dias,
a querer a nudez despetalada das coisas.
O abraço que descostura,
o passo que entalha,
a areia que grava.
Aprendi a escrever seu nome na memória das pipas.

Quando sonhei ser eterno feixe paralelo,
deixei afundar o peso da linha reta
(nunca me faltou gratidão no escuro).
Mas vieram as maravilhas tecidas a fio de voz.
No desvio, desejei seus corredores.

Tempos cruzados, silêncio sereno e longevo.
Retratos pulsam e contraem distâncias.
Cores ancestrais acolhem a sépia
do idioma das nossas horas.

Nossas almas antigas
vivem de saber
que todas as coisas
são primeiras.

RF
12/06/2015
19h24