sábado, 7 de março de 2015

Dois Balões Azuis (Valentina)

Pouco a pouco, passo torto a vagar,
meu corpo eleito celeste encontra o pouso no ar.
Paira o riso, o aplauso desce ao chão,
sem medo, sobe o alívio, ave de pés e mãos.

E dos olhos da plateia a assistir
surgem crianças serenas - seu brilho chega aqui:
a acolhida que me envolve os braços nus.
Nos ombros, o afago invisível
de dois balões azuis.

Algo errante em mim segue sem saber,
nada me arranha o instante, o peso se faz ascender
Mesmo o tempo se encanta e cede ao voo
pausa perante o eterno, segue por onde eu vou.

Lentamente, os acenos ao final
Mergulham como um remo em marés na vertical
sobre as vestes, sobre o vento, sob a luz.
Nos ombros, o afago invisível
de dois balões azuis.

Gravidade é dança que não espera, não
se desvela, então, dos casulos dos olhos meus
Respira e se atrasa sem pedir perdão
pois temer é viver suspenso
e morrer é sonhar de fora pra dentro.

Pouco a pouco, passo torto a vagar,
meu corpo eleito celeste encontra o pouso no ar
sobre as vestes, sobre o vento, sob a luz.
Nos ombros, o afago invisível
de dois balões azuis.

RF
05/03/2015
circa 23h30

Répteis

Neste lugar que nos recebe de passagem,
onde tudo fala e transborda,
onde corpos não conhecem portas
que comportem o direito de passar,
não sei por que você tomou tal forma,
não sei quando você retorna
e não quero perguntar.

Como répteis que, afoitos, antecipam terremotos,
você vem e anuncia o piso instável.

Não julgo seus espelhos, nem divido os meus.
Não acuso as novidades, não culpo o que aconteceu.
Se o ar é reflexo, se vidro rachado,
se vê sua imagem e volta transformado,
esta terra consentiu, jamais eu.

Como aves que voam baixo e antecipam temporais,
você diz que de cima o alívio não vem mais.

Este lugar que nos toma entre peles, escamas, pelagens e penas,
roupagens estranhas e paisagens amenas,
sempre nos define, jamais nos sustenta.
Figuras várias para cada passagem,
águas em transe, ligeiras folhagens,
o caminho se alarga, entranha e inventa.

Com os meus ossos que não sentem nem se elevam,
lhe aguardo para dizer
que estou cansado.

RF
02/12/2014
13h31