sábado, 19 de novembro de 2011

Tarântula

Oscila no ventre esta náusea com pernas,
Pata por pata, palavra formada,
Palavra rasgada de proles eternas.
Perfeita rajada.

Homens são rastro, são síladas secas,
Desérticas veias escalam os membros,
Senhroas da sede e das gotas do tempo.
Sangramos em fendas.

Aqui, nossos mapas enredam as teias,
São presas mútuas à mesa da ceia,
O ferro forjado em chama fajuta,
O vento sabota nossa labareda.

Projétil partido, desaparecido,
Sem destinatário, bastardo parido,
Da areia nos lábios insulto cuspido.
A ira dispara.

Jamais se repara, nem deixa poeira,
Perigo que some, mas sempre avança,
A mais sorrateira de todas as danças.
Fraterna tarântula.

Aqui, nossos mapas enredam as teias,
São presas mútuas à mesa da ceia,
O ferro forjado em chama fajuta,
O vento sabota nossa labareda.

RF
Início: aprox. 22/04/2009
Término: de 19/11/2011 para 20/11/2011, 1h16AM

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Uma Letra: "Os Muros"

Não diga a ninguém
E não tente explicar se alguém descobrir
Jamais diga que eu estava ali
Tente não fantasiar, acredite em mim

Não pergunte por quê
Se um dia eu faltar, pois certezas não há
Serão poucas pra mim, para você

Apenas diga aos seus pais que vai dormir,
Apague a luz do quarto após se despedir
E me encontre
Atrás das pálpebras.

Não me peça perdão
Se tiver de partir porque a noite se esconde
Sei que os muros da sua casa ficam longe

A quem se preocupar com a minha ausência,
Apenas responda que tudo que sabe é que eu encontrei meu lugar.

Apenas diga aos seus pais que vai dormir,
Apague a luz do quarto após se despedir
E me encontre
Atrás das pálpebras.

RF
26/12/2009
02h50 AM

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Uma Letra: "Alice Nua"

Alice nua no olhar
Que a lente captura entre as mãos
Qual ave ingênua e vulgar
Cercada por minha intenção

No estalo do tempo nas paredes,
Doce crime que ainda não é meu;
No meu foco, celas enquadradas;
Nelas, Alice, e o seu fim sou eu.

Não é arma o desejo incontido
De um dia completar seus passos,
Mas a assimetria da alma
Escondida em nossos frágeis laços

E nas histórias que conto pra mim
Me traduzo em você.

Minha musa com prosa fecundei
Exalando fuga sob o sol
Das mil tardes secas que criei
A partir de um fôlego só

Sobre ela sou eu meu confidente,
Mas pra ela conto sobre mim.
Nunca sabe, por mais que lhe revele,
Que me traio mas me aproximo assim.

Se nas sílabas sinto o peso
Que treme o corpo e treme a fala,
Cultivarei meu jardim de vozes
Para em coro então chamá-la.

São só dela, portanto, as quinas
Da minha fé tão angulosa,
Erodida, condenada em si
E perfeita porque desgostosa.

E em meus recantos de infância, Alice,
Eu desnudo você.
Rodrigo Fróes
circa 12/06/2007

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Poema-coágulo

Tudo o que guardo de você
Se encerra neste punho
Tendo percorrido o braço esquerdo
Para lhe desaguar os versos
De uma veia que estoura
Como quem chega
À última parada
Da fé.

28/05/2009
14h12

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Uma Parceria: "Confete" (Bernardo Canto & Rodrigo Fróes)

Joga o peso do mundo de um ombro pro outro,
Os tornozelos frágeis abrem o caminho,
O desapego faz o seu figurino
E a sua dança eu quis fotografar.

Gestos breves e expressões tão obtusas,
Sem ter frase, zomba e ri das minhas Musas,
Mas é lisonjeiro o desespero
Que há tempos guardei para você.

Nunca me queira tentar ao me encarar como quem vê um igual.
Neste baile de vaidade travestido em Carnaval,
Jogo confete na sua verve.
Depois reclamo, tirano, da sujeira que terei que limpar.

Sua nudez agride o meu pé descalço,
O desnível faz do palco um cadafalso
De ponta-cabeça quando os aplausos
Rebentam sem saber para quem.

Esta face doce desta minha posse
Ao lhe ver dançando quase se retorce,
Feito um exagero, um medo antigo
De ser eu, ser só meu e mais ninguém.

Nunca me queira tentar ao me encarar como quem vê um igual.
Neste baile de vaidade travestido em Carnaval,
Jogo confete na sua verve.
Depois reclamo, tirano, da sujeira que terei que limpar.

02/01/2010, 01h13 AM

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Poema: Voz

Não há lógica densa que me convença de haver pecado por te desejar
Tampouco tribunais, ou guilhotinas da moral:
És íntimo que não me pesa.

Aquilo de que me privo na distância mas a que me autorizo na proximidade
Talvez jamais conheças
(mas talvez suspeite).
Deixo-o correr solto no anonimato, não me perdôo nunca, pois nunca hei de perdoar o que é meu.
Conjugo a liberdade para ser e a necessidade de se reservar.

Há algo que em mim consentiu e não é cúmplice,
Que tu, eu e os demais não entendemos.
Oscila, raciocina, fraqueja,
É bípede e articulado, defende-se, argumenta, permite-se,
Imobilizou a culpa e a devorou de uma vez,
Com ossos estalando confirmação.
E isso não se julga, não se enxerga,
É e o é de forma insuperável, e nenhum de nós pode-quer-irá delatar.
Pois não há eu autônomo,
                tu convicto,
                eles em maioria,
                maiorias corretas
                que me convençam de haver pecado por te desejar.


(Entre janeiro e março de 2007)

sábado, 2 de julho de 2011

Notívago

Notívago
Devora a luz que ninguém vê
Contrarquiteto do mundo
Desgasta os vértices da manhã

Notívago
Tem celas em suas pálpebras
Crê não ser o único
Mas tanto faz.

Vendaval a destelhar o sono
Leva os cílios que dizem "não"

Vendaval a invadir os outros
Feito areia nos olhos
A salgar os sonhos
Brisa quente que afoga o peito
(porque a exclamação é ponte suspensa
que não deixa o desespero passar)!

Encontra a beleza e não espalha
Ou o crepúsculo te faz refém
Ou os demais virão
Por esquecer
Que o cansaço se faz menos das horas
Que dos outros

Notívago
O vértice em que se apoia
Talvez a noite
É solar e radiante
Solidão.


RF
23/08/2009
23h29

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Plenitude

Quando lhe falo do meu coração,
Falo de carne, coronárias, sangue e ventrículos,
Não lhe omito nada, e nada mereceria omissão.

Quando declaro essa essência juvenil,
Falo de suor, sêmen, saliva, pele e inconveniências.

Há de se ser feliz desmembrando as belezas nas entranhas,
Para se entender o amor
E que o amor também é feio e é palpável.
RF
2006

sábado, 19 de março de 2011

A Paz Comum

Dor de cabeça
Desconforto
Desassossego
Desapego
Medo
Não importa,os motivos são muitos e a vida, uma só.
Por isso, desencrava esta culpa que está tudo bem.
Não há mal nenhum em não fazer o que ninguém

Faz

Anos,
Meses,
Horas,
Faltam muitas,
Faltam obras,
Fazem falta,
Mas você tem a sua própria enxaqueca para criar.

E a luxúria,
E o sossego,
E a anemia de uma vida segura
Vaselinada por palavras perigosas,
Porque o atrito é ficto
E o gozo também.
Não há mal nenhum em ser só homem de bem.

Veste o corpo, capacete,
Leva a espada e o colete,
Faz de conta e depois desmarca,
Mais vale o festim que a rajada.
Pega o ônibus, se esconde na frente,
Que a vida não lhe raspa (mas passa rente).
Sua sorte é ela se confundir no meio de tanta gente

Igual

A ontem, lê seus versos, se envaidece,
Se masturba, reza e adormece
E não se esquece, nem por segundo,
De quão aconchegante é o travesseiro chamado "Todo Mundo".

06/11/08
0h41

sexta-feira, 4 de março de 2011

Um poema? Uma letra? "O descobrimento do Estranho"

Aportaram contra as praias
Atearam fogo às pedras
Entoaram uma tocaia
Silenciosos sob a relva
Assentaram suas fúrias
Saciaram seus percalços
Vomitaram sua gana
Exibiram seus mercados
Desnudaram-se nas minas
Afogaram seus pecados
Importaram suas Igrejas
Lambuzaram seus projéteis
Lecionaram sobre a selva
Desmataram uma mágoa
Desbravaram uma mata
E fundaram um país
Em mim.

(por volta de 19/12/2005)

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Um poema: "Fantasias"

Acredite em mim: eu sou sujo.
As minhas entranhas por vezes urram o indizível,
Pedindo uma satisfação rasgada e abusiva.

Não há uma besta dentro de mim - eu sou o próprio animal insaciável.
Curioso, criativo, quase vulgar,
Um alvoroço de mandíbula e vísceras dependuradas do raciocínio.
Um par de rins esfomeados e autofágicos,
Mãos encrespadas pela cegueira do tato freado.

Sou mais do que se enxerga em fendas do que nas planícies,
Só que as roupas são demais apertadas e asfixiam em pequenas celas o íntimo flamejante.
Meus sonhos são as cheias dos corpos cavernosos,
Serpenteando espinha e cerebelo,
Fazendo abrir-se em espasmos este leque de vontades cortantes.

Mas a minha maior fantasia é te proteger.


RF
25/09/2006
Às 2h31 AM

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Uma letra de música: "Vontades Aladas"

Galera,

Esta é a letra que me inspirou a batizar o blog. Um dia será gravada, seja com minha querida Tijolo de Vera - http://www.myspace.com/tijolos , para os que não conhecem -, seja com algum outro projeto.

Vontades Aladas

Minhas vontades aladas desconhecem chão
E a gravidade ferida me amassa os tendões
Sou garimpeiro da alma neste aluvião
São meus coadjuvantes amantes e arpões.

Minhas gavetas de vida têm tudo que há
Porém gavetas de morte só sabem falar
Me aproxima o rosto um beijo pendular
É o meu tempo chegando, o meu tempo a passar.

Se sobrevivem as palavras
Quando sobreviver asfixia,
Por que não mais acreditar em asas?
Faço casulos desta melodia.

Voo agridoce, acre e dócil
Põe a planar doçura agredida
Sobre as maiores distâncias internas
Que nesta alma não terão medida.

Fazer da vida vitrine me parece são
Mas este choro retido me afoga os pulmões
Fazendo mar clandestino ao toque das mãos
E navegando o reverso das intuições

Por cada noite acordado que atravessei
Ao outro lado da dor finalmente eu cheguei
Somei feridas e arestas, as minhas, de alguém,
Deixei de herança os meus frutos, e fome também.

Quando abertos nossos mares,
Falta-me fé ou te excede o zelo
Se ao consumar de cada travessia
Crês em milagres e eu em tornozelos?

Ninguém escapa desta sorte:
Tudo que não germina enlouquece
Faço ferida funda para despertar
E expelir recortes desta prece

Como se nada houvesse.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Primeira Cheia: Uma Lista

Olá a todos!

Madrugada de sábado para domingo, acordado há quase vinte e uma horas, e resolvi fazer uso deste tempo (e pique) para inaugurar este espaço.

O título que dou a este blog é uma referência àquela parte da gente que pode corresponder a uma vastidão, a um mundo, mas que fica grande parte do tempo escondida, aguardando em silêncio a chegada a um ponto específico do trajeto onde poderá enfim ganhar espaço e identidade próprios. Pretendo, portanto, fazer aqui uma janela do que vem a ser o meu mar clandestino - e chego a este ponto inspirado por um grupo de pessoas queridas que fizeram o mesmo com os seus, dando a eles os nomes que julgaram adequados.

Mas comecemos devagar: apresentar uma ideia desta forma pode parecer um tanto pretensioso em se tratando de apenas um blog. O que eu tenho de clandestino a mostrar aqui nada mais é do que uma gama de paixões normais e, no meu caso, extracurriculares: o bom e velho falar de música, cinema e poesia quando se pode respirar da rotina.




E a primeira parte deste papo que proponho a vocês vem inspirada pelo indivíduo acima. Para os que não conhecem, trata-se de Rob Gordon, amargurado ex-DJ e dono de loja de discos que tem por hábito avaliar os momentos da sua vida traçando paralelos com músicas que os marcaram - ou ao menos é este o quadro que ficou na memória do filme "Alta Fidelidade", que me apresentou a esta figura (nascida, por sua vez, no livro homônimo de Nick Hornby, onde, antes de ser encarnada por John Cusack, se chamava Rob Fleming) e é digno de ser mais uma vez revisto, tendo em conta os quase oito anos desde a última visita, de modo a construir uma recordação que lhe seja mais fiel. Mas isso pouco importa agora: pego emprestado de seu anti-heroico, carismático e às vezes quase insuportável protagonista apenas o hábito que, no começo dos anos 00, o tornou, digamos, pop - o gosto pela elaboração de listas.

Se as listas de Gordon iam desde os cinco maiores foras que levou de mulheres até as cinco melhores faixas de abertura de discos de música pop (isso, novamente, se a memória não me passa a perna...), meu raio de abrangência é bem mais humilde e menos expositivo. Afinal, o que nos custa sermos leves às 02h49 da manhã?

Então, deixando para trás algum rigor e abraçando descaradamente um certo plágio temático, trago aqui uma lista de dez (sim, dez, e não cinco, pois não estou em condições de ser sintético; além do mais, restrições em excesso seriam um contrassenso aqui no blog) grandes faixas de abertura de discos que ouvi ao longo dos últimos anos. Não me dei ao trabalho de classificar quais as melhores, o que seria deveras injusto para com as próprias, já que muitas delas são extremamente diferentes entre si.

Vamos lá, então?

1. "Back In The Saddle", Aerosmith, no disco "Rocks" (1976):
http://www.youtube.com/watch?v=bDKxUt9UkmU

2. "Samba a Dois", Los Hermanos, no disco "Ventura" (2003):
http://www.youtube.com/watch?v=EHHT1yyGquQ

3. "Good Times, Bad Times", Led Zeppelin, no disco "Led Zeppelin" (1968):
http://www.youtube.com/watch?v=Cm2-K6ttHYs

4. "Deus Lhe Pague", Chico Buarque, no disco "Construção" (1973):
 http://www.youtube.com/watch?v=nq7TTaG2bhs

5. "Everything In Its Right Place", Radiohead, no disco "Kid A" (2000):
http://www.youtube.com/watch?v=onRk0sjSgFU

6. "Seven Nation Army", White Stripes, no disco "Elephant" (2003):
http://www.youtube.com/watch?v=0J2QdDbelmY

7. "Found That Soul", Manic Street Preachers, no disco "Know Your Enemy" (2001):
http://www.youtube.com/watch?v=9PXyruq_ktM

8. "Becuz", Sonic Youth, no disco "Washing Machine" (1995):
http://www.youtube.com/watch?v=kqPrP5aa5eU

9."Felicidade", Marcelo Jeneci, no disco "Feito Pra Acabar" (2010):
http://www.youtube.com/watch?v=4PSqwdUo_sc

10. "Welcome To The Working Week", Elvis Costello, no disco "My Aim Is True" (1977):

http://www.youtube.com/watch?v=iSyBVhgPy5A

Ouviram alguma? O que acharam? Compilando-as, cheguei a cogitar um CD apenas de "Number Ones", o que, à medida em que fossem organizadas em determinada sequência, levaria à diluição do impacto que possuíam como atos de abertura de seus álbuns originais e, logo, acabariam por forçar uma reavaliação da força que de fato possuem. Ou será que teríamos um aberrante (e talvez sensacional) disco de dez aberturas, cada uma sugerindo uma criatura distinta, dadas as suas peculiaridades?

Devaneios de quem precisa dormir à parte, vamos incrementar a brincadeira. Digam vocês também quais faixas de abertura deixaram uma marca, seja por anunciarem um grande disco que só fez se confirmar em seguida, seja por representarem um belo, porém desperdiçado, começo.

Um abraço e bemvindos!!!!